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Anel de Giges: revelando a alma humana

27 de novembro de 2020

Texto: Marina Vidal – estagiária sob supervisão

O Sempre Um Papo recebeu escritor Eduardo Giannetti para o debate e lançamento do livro “O Anel de Giges” (Companhia das Letras). Esta foi mais uma edição do projeto que está acontecendo de forma virtual, devido à pandemia do Covid-19. A conversa foi mediada pelo jornalista Afonso Borges, no dia 26 de julho de 2020, sendo transmitida pelo Youtube, Facebook e Instagram do Sempre Um Papo.

A conversa teve início com Eduardo Giannetti explicando que o nome do livro surgiu a partir da fábula Anel de Giges de Glauco, irmão do Platão, em provocação à Sócrates. Giges é um camponês humilde que um dia encontra um anel de ouro, entretanto não é um anel comum. “Ele percebe que quando gira o anel para dentro, as pessoas começam a falar dele como se ele lá não estivesse. Ele pega o anel, gira de volta e as pessoas de novo percebem a presença dele, novamente se tornando visível. Ele testa várias vezes e funciona sempre”, conta o autor.

Com a posse do anel, o personagem seduz a rainha da capital, assassina o rei e se torna fabulosamente rico. “Então, ele passa a oferecer prendas de ouro e prata no Templo de Apolo em Delfos tentando obter, de alguma forma, perdão pela dívida que contraiu ao transgredir triplamente a lei moral”. Por meio do anel, Giges se vale de impunidade judicial ou moral para qualquer ação cometida independente de sua natureza. “Porque que o Giges, com esse anel, deveria continuar pautando a sua relação com os outros pela justiça e pela honestidade, se agora ele pode obter todas as vantagens, prazeres, benefícios, sem nenhum custo?”, indaga.

Para responder Glauco, Sócrates se utiliza do argumento no qual a alma de cada cidadão de Atenas é uma réplica da sociedade corrupta a qual vivemos. “A alma individual reflete, em letra minúscula a corrupção, o apego aos prazeres dissolutos, a devassidão, as cisões, a maldade, a guerra que nós transportamos a alma por causa de uma estrutura viciada”, explicou Eduardo. O autor relatou que Platão tinha uma proposta de solução para isso, que envolvia deixar os filósofos governarem. “Nós não vamos corrigir os vícios, a maldade, a corrupção da nossa alma, se nós não fizermos uma mudança muito abrangente e estrutural do mundo em que nós estamos vivendo e a solução para isso depende que o governo seja exercido, que isso aconteça com pessoas sábias. Daí vem a figura do rei filósofo”.

A metáfora do anel

Segundo Eduardo Giannetti, o anel é uma metáfora para o verdadeiro comportamento das pessoas, que viria à tona a partir da suspensão da vida civilizada e que, por isso, revela a alma humana. “Eu descobri que eu podia contar a história da ética pelo prisma do anel. Como é que as diferentes tradições da ética e as escolas de pensamento na ética lidam com a possibilidade com a certeza da impunidade”, pontuou.

No livro, Eduardo também analisou como um cristão ideal usaria o anel e utilizou da ética kantiana e do utilitarismo para realizar essa reflexão. “Um cristão perfeito de posse do anel não mudará em nada o seu comportamento porque não há nada que ele pensa, sinta ou faça que não possa ser do conhecimento de todos. Ele é uma pessoa absolutamente transparente, absolutamente boa na sua essência. Isso no fundo é Platão”.

O autor acredita que o autoconhecimento é muito importante. “A pessoa precisa reconhecer que é muito mais parecida com o que ela condena lá fora do que ela gostaria de imaginar”. No último capítulo, ‘Devaneios do Viajante Solitário’, Eduardo realiza uma narração em primeira pessoa em uma viagem de ônibus sobre o que considera que faria com o anel de Giges hoje. “Eu considero como eu iria usar o anel no trabalho e nas finanças pessoais, como que eu iria usar o anel para fazer as coisas que eu acho boas, na política, como eu iria usar o anel nas relações afetivas e amorosas. Eu não vou contar porque seria um spoiler e ninguém vai ler o meu livro”.

Provocado por Afonso Borges, Eduardo Gianetti fez uma pequena revelação para provocar o leitor. “No livro, tento conquistar uma mulher usando o anel e eu me dou super mal”. Para concluir, o autor realizou uma provocação para as pessoas que irão ler o seu livro. “No fundo, eu espero que quem interagir com o livro, olhe para si e realmente pergunte: No fundo do meu coração, que tipo de pessoa eu me tornaria se eu dispusesse do poder do anel. Se você tiver a prerrogativa de fazer o que bem entende e deseja sem precisar temer a lei, sem precisar temer o que os outros vão falar sobre você, sem ter qualquer risco de ser pego e ser punido, o que você faria da sua vida, o que mora no fundo da sua alma?”

Essa conversa na íntegra pode ser assistida nas redes sociais do projeto, Instagram e Facebook e no canal do Sempre um Papo no Youtube, por meio do link: https://www.youtube.com/watch?v=CIfdQKknmEc